PATRONO: "O Roubo do Cofre de Santo Antônio", de Dr. Gilberto Madeira Peixoto
O ROUBO DO COFRE DE SANTO ANTÔNIO
DR. GILBERTO MADEIRA PEIXOTO
Médico, historiador, poeta e escritor sabarense. Patrono da Cadeira 11 da Academia de Ciências e Letras de Sabará, ocupado pela pesquisadora, músico e professora, doutoranda e especialista em Patrimônio pela Universidade de Extremura/Espanha, Graziela Armelao Jácome Rosa.
DR. GILBERTO MADEIRA PEIXOTO
Mês de
Junho, o frio começa a surgir no povoado de Roça Grande (Sabará-MG), os devotos
de Santo Antônio começam a rezar e o Pároco Frei Januário faz as preces e
pedidos de esmolas para a construção do novo santuário em homenagem ao santo,
pois já se aproxima o dia 13 de junho.
Na
igreja, pobre, mas local de grande devoção, dois cofres são colocados, o
primeiro no corpo da Igreja, bem na entrada, para os pedidos do santo, e o
segundo, perto da sacristia, é o maior e será para as ofertas.
Chegou,
enfim, o dia 13 e os cofres já estão abarrotados, quer de pedidos, intenções ou
dinheiro. Frei Januário recomenda olho vivo para o sacristão José, homem
geboso, um tanto deformado, semelhante ao corcunda de Notre Dame (do filme) e
que a criançada, inocentemente, o chamava de quase muda (Quasímodo era o
nome do personagem de Vitor Hugo). Interessante é que realmente falava pouco,
configurando ainda mais aquela alcunha...
Após a
festa, Frei Januário resolveu guardar o cofre dos donativos, já abarrotado, na
sacristia, deixando no mesmo lugar o segundo cofre com os pedidos, imaginando
que alguém ainda pudesse colocar algumas solicitações, sabedor que a maioria
dessas súplicas era para casamento, e avisava para ao Zé Sacristão: “Tome conta
de tudo!”
À noite,
Zé percebeu uma luz fraca na igreja e resolveu verificar, matutando: “eu
apaguei tudo, não há razão para as luzes acesas, vou lá”!
Ao chegar
ao corpo da nave, percebeu um barulho estranho e observou mais atentamente, quando
sentiu que o ruído vinha do altar-mor e refletiu, “Santo Antônio deve estar
dormindo a esta hora e não faria barulho algum”.
Olhou,
escutou, raciocinou e observou mais, pois tivera a certeza de que ali estava
alguém. Resolveu dar uma de esperto e gritou:
— Quem
está aí?
Nada de
resposta. Gritou novamente:
— Quem
está aí? Responda, senão atiro com a minha garrucha!
Uma voz
apagada veio do altar:
— Não
atira não. Nóis é anjo...
— Anjo? —
indagou o Zé — Então avua!
— Nós num
sabe avuá, não, nóis é fiote... Nóis tamo aqui a pedido de Santantônho!
— Bem, —
respondeu o Zé, o corcunda — se é assim, pode ficar, mas cuidado com o altar e
não mexa no cofre de Santo Antônio.
No dia
seguinte, Frei Januário, ao entrar no templo, deu falta do cofre menor, o que
tinha os pedidos dos devotos.
— Zé,
sumiu o cofre de pedidos, você viu alguma coisa?
Sem
maiores delongas, o Zé respondeu:
— Sim,
Frei. Tinham dois anjinhos ao lado de Santo Antônio e na certa levaram o cofre
de pedidos para arrematar e atendê-los mais rapidamente.
Frei
Januário olhou, franziu a testa e entortou a sobrancelha, olhou por cima dos
óculos e disse:
— Zé,
anjo não fala, não vem à noite e não leva cofre. E Santo Antônio é milagroso,
mas não chamaria anjos.
— É a
pura verdade, meu guru — argumentou o Zé, contra o sacerdote...
— Ainda
bem que só levaram o cofre dos pedidos, pois o cofre maior contém parte do
dinheiro para construirmos o novo santuário.
—
Venerável Frei Januário, — dizia Zé — eu mesmo vi que eram anjinhos, ainda
novinhos, coitadinhos... até fizeram xixi embaixo do altar.
— Meu
caro cadete, não existe anjinho novinho. E anjo não faz xixi! — exclamou.
— Uai,
eles não bebem água?
— Ne
sutor ultra crepidam! — exclamou Frei Januário.
— Que é
isto Frei Januário, o senhor ralhou em latim o PQP?
— Puts
merds, deixe de ser bate-orelha, para não dizer ignaro, burro — esbravejou Frei
Januário, com a testa enrugadas: — o anjo não tem pipi.
— Então,
quem era a dupla ajudando Santo Antônio, no altar?
— São os
gatunos que queriam levar o dinheiro da festa!
— Mas
eles eram tão novinhos — argumentou o sacristão Zé...
— Ah, — respondeu
o Frei Januário — deixe isso pra lá, seu capiau... “quase-mundo”, vamos limpar
a sujeira e preparar a limpeza para a Santa Missa e adeus cofre (urna) de
súplicas.
ab
Nota: conto inspirado em narrativas de moradores locais e embora os fatos e feitos possam ter acontecido, os nomes dos personagens foram modificados. Foi publicado, originalmente no “Almanaque 2012 de O Acadêmico”, pela Faculdade de Sabará.
ab
Nota: conto inspirado em narrativas de moradores locais e embora os fatos e feitos possam ter acontecido, os nomes dos personagens foram modificados. Foi publicado, originalmente no “Almanaque 2012 de O Acadêmico”, pela Faculdade de Sabará.
ab
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Bom saber que o Dr. Gilberto escrevia.. e bem! Gostei! Narrativa leve e gostosa de ler!
ResponderExcluir- Geraldo Jurema Guimarães
Nóis é fiote, nóis não avua!
ResponderExcluirGostei. Muito bom!
Obrigado pela oportunidade de ler este conto. Tudo que é história de Santo Antônio eu gosto de saber.👏👏👏
Também não sabia que o Dr. Gilberto escrevia....e contos! Já havia lido no Academico, mas foi gostoso reler!!!!Mônica Maria
ResponderExcluirGostei da narrativa onde o tempo/espaço nos joga dentro do cenário! Um texto símplice como o sacristão Zé! Ótima construção!
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