"A FIDELÍSSIMA VILLA DE SABARÁ E A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL", de José Arcanjo do Couto Bouzas
Membro-fundador da Academia de Ciências e Letras de Sabará
Cadeira 6. Patrono: Arthur Lobo
A FIDELÍSSIMA VILLA DE SABARÁ
E A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL
Desde
1500, ano da chegada de Cabral ao Brasil, o país viveu sob a Coroa portuguesa,
só se emancipando em 1822, ano da Independência.
Para
comprovar isso, basta olhar a abertura das atas da Câmara, para vermos citações
como: “o povo é lembrado pelos soberanos,
pois temos origem a portugueses honrados”. A
Câmara prometia vassalagem eterna. Quando chegava — com meses de atraso —
notícia de algum acontecimento “auspicioso”, como
casamento ou nascimento de um príncipe ou princesa, eram realizadas, durante
dias, festas memoráveis, com grandes despesas para a municipalidade e para povo,
pois todos deveriam participar. Os gastos eram divididos entre a Câmara e a
iniciativa privada, como comerciantes, fazendeiros, mineradores, notários, etc.
Com a chegada de Dom João ao Brasil, em 1808, as promessas de vassalagem eterna
continuaram, mas as relações entre o Rei, os portugueses no Brasil e os
brasileiros se tornaram um pouco mais claras, e o país ficou menos dependente,
até por força da situação das cortes portuguesas aqui instaladas, que se viram,
de uma hora para outra, obrigadas a viver em um lugar, podemos dizer, um tanto
estranho para os padrões europeus da época. Mas D. João não perdeu tempo e
tomou medidas importantes para fazer do Brasil um lugar habitável, civilizado e
digno de se tornar Reino Unido a Portugal e Algarves.
Mas já existiam aqui movimentos
que visavam tornar o país independente de Portugal.
Alguns anos depois, após a
expulsão de Napoleão Bonaparte de Portugal pelos ingleses, a corte se viu
obrigada a retornar a pátria amada, pois D. Manuel, irmão de D. João, passou a
se achar no direito ao trono
lusitano. O desassossegado rei português, acuado, passou a regência do país
para o seu dileto filho, Pedro, e tomou rumo à Europa, dessa vez com bem menos
gente de quando aqui chegou. Parece que muitos portugueses passaram a gostar da
terra “brasilis”. Quem não gostaria?
D. Pedro de Alcântara, o filho
herdeiro, passou a viver e a governar com um olho no Brasil e outro em
Portugal, como era de se esperar. Mas o tempo ia passando e os brasileiros
pressionavam D. Pedro, através de políticos da estirpe de José Bonifácio
Andrada, a se posicionar a favor de uma menor dependência do Brasil junto à
Portugal. Em Sabará, o professor régio de Gramática Latina, Joaquim Manoel de
Faria Lima e Abreu, protestou contra as “dispendiosas e inúteis” comemorações
pelo nascimento, em julho de 1822, de D. João III em Portugal. O mestre não
estava sozinho. Finalmente, depois de muita pressão e de muito pensar sobre o
assunto, o futuro imperador brasileiro, a 7 de setembro de 1822, proclama a
Independência do Brasil, não sem antes enfrentar a resistência dos portugueses
que aqui ficaram, e de brasileiros que queriam continuar com a situação de
servilismo e dependência, mantendo o país no antigo sistema colonial. Estavam
mesmo era interessados em manter seus privilégios.
No sertão nordestino, morreram
muitos brasileiros na luta pela independência definitiva.
Era preciso instalar logo as
cortes brasileiras, fazer eleição direta dos deputados, pelos povos nas juntas
paroquiais.
D. Pedro então toma posse do
cargo, com a título de Io. Imperador Constitucional do Brasil.
Sabará, ainda vila — uma herança
colonial —, envia para o Rio de Janeiro um representante, o Sargento-Mór Manuel
de Freitas Pacheco, vereador mais velho, para o “beija-mão”.
Porém, as notícias de que o
Portugal pretendia aniquilar a independência do Brasil, retornando o país à
condição de Reino Unido, provocam, nos sabarenses, como em todo os brasileiros,
manifestações contrárias as ideias facciosas de Lisboa.
Chegou ao Rio de Janeiro a notícia de que, em Ouro
Preto, alguns elementos perniciosos, inclusive na Câmara, trabalhavam para a
manutenção do status quo anterior à independência. Um padre, Antônio
Fernandes Taveira, Vigário de Congonhas, talvez português, pregava a
continuação do Brasil como Reino Unido. Desconfiava-se de que, também na Câmara
de Sabará e em outras vilas mineiras, indivíduos demagogos pregavam contra o
Império Brasileiro. Inclusive, era forte suspeito o Juiz de Fora da vila, José
Antônio da Silva Maia, outro patrício.
Mas o antigo Intendente da Fundição do Ouro, antes da
criação da Casa da Moeda, José Teixeira da Fonseca Vasconcelos, sabarense —
futuro Visconde de Caeté —, membro da Câmara em 1822, Desembargador Ouvidor,
depois Vice-Presidente do Governo Provisório, atuou com muito vigor e influiu
bastante no processo da independência brasileira.
Estava claro que, para a maioria dos brasileiros, a
independência definitiva do Brasil era um acontecimento político que não
poderia ter retorno.
Para os sabarenses, que não gostavam de se meter em
política, pelo menos abertamente, pois, antes de tudo, eram grandes
comerciantes, essa era a hora de fazer grandes negócios e receber produtos,
finalmente liberados para serem fabricados no Brasil, barateando os custos e
dando lucros.
A vila, e depois cidade, tinha muitas lojas de
tecidos, ourivesarias, couro, artesanato, armazéns de secos e molhados, bares,
e até pequenas fábricas, espalhados pelas suas tortas vielas, por onde
transitavam gente de toda parte, “matutos sertanejos”, comprando e vendendo,
como dizia Sir Richard Burton em 1865. Mas as suspeitas continuavam, e até
descobriu-se um provável contra-golpe em 30 de outubro de 1822. Através de uma
Portaria de 11 de novembro daquele ano, foi então instalada em Minas uma
Devassa nas Câmaras de Ouro Preto, de Sabará e de outras vilas. Em Ouro Preto,
a temida Devassa, depois de intenso trabalho inquisitório, fez aparecer um
culpado, mas que foi perdoado pelo Juiz inquiridor, pois o réu se arrependeu e
se retratou.
Em Sabará, foram inquiridas 30 testemunhas, com
intenso rigor, para apurar quem eram os demagogos e anarquistas que estavam
conspirando contra o Império Brasileiro e que desejavam o retorno à dependência
do Brasil a Portugal.
Todos negaram, e tudo acabou “em pizza”, como
hoje se diz, maldosamente.
Ficou comprovado que a Imperial Vila de Sabará não se
aliou aos facciosos e saudosistas, defensores do retorno ao colonialismo
português. A Câmara mandou até uma tropa de voluntários para lutar em Ouro
Preto. O Imperador, como recompensa, agraciou os sabarenses com o nobre e
pomposo título de “Fidelíssima Cidade” do Império do Brasil,
publicando um decreto, mandado afixar em todas as esquinas das ruas da
orgulhosa Sabará, datado de 17 de março de 1823.
Comemorou-se o auspicioso título, com festas, salvas e
fogos soltos na Fortaleza, missa, Te-Deum, repiques de sinos, desfiles
com figuras mitológicas, uma opereta com o título de “Catarina I”, apresentação
da orquestra de Ouro Preto, com participação de músicos sabarenses — até uma
serenata teve —, e procissão saindo do Carmo para a Matriz, da qual o Barão de
Catas Altas, que estava acamado, compareceu vestido com roupa imperial. Ele
retornou rapidamente para o seu solar, à rua Direita, antiga residência
construída pelo nobilíssimo Padre José Correia da Silva. Foi, assim, mais um
momento de glória para a história da antiga Vila Real, que participou de forma
discreta, mas inteligente, da Independência do Brasil.
Gostei, embora nascido em Bhte, tenho minhas origem em Sabará, e me considero Sabarense à 60 anos.
ResponderExcluirParabéns ao amigo José Arcanjo Bouzas, pela apresentação de tão importantes acontecimentos em nossa história revivendo a memória de fatos que mudaram o destino de nossa amada pátria.
ResponderExcluirBelissimo texto Bouzas, de eria ser publicado na Fha de Sabará e e viado às instituições de ensino local. Encontrei sinais e vestigios da Lei Rouanet com os mamadores na teta do governo então temiam a perda destas be esses.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirBelíssimo e esclarecedor texto , professor . Sinto-me honrada por compartilhar comigo . Forte abraço, Cássia Frois
ResponderExcluirDarsoni de Oliveira Caligiorne disse...
ResponderExcluirAdorei ler e aprender que a história não é territorial mas é cidadã. Que riqueza de fatos vc trouxe neste dia da independência, em que foram marcantes a organização e presença das escolas nas ruas de Sabara! Adorei!! Parabéns
Show!!! Você mais uma vez fazendo a diferença . Que aula rapaz!!! Parabéns e aguardo o próximo ok? Sucesso sempre.👏👏👏👏
ResponderExcluirMagnífico este texto meu querido Tio José Arcanjo! Sempre perfeito nas suas aulas de História do Brasil , Minas e Sabará ! Só aprendemos com você !
ResponderExcluirVanessa Chaves
Uma verdadeira aula de história, ministrada e contada por um excelente narrador e historiador!
ResponderExcluirComo é gratificante ter acesso a esses raros ensinamentos da história!
Ficamos no aguardo de novas publicações desse gênero! Obrigado Zezinho!
Geraldo Jurema Guimarães
Como sempre,claro e direto,nos ensina,nós faz entrar na história do Brasil de forma aprazível e esclarecedora
ResponderExcluirSei q tm muitos ensinamentos ainda a nos proporcionar,avante!
Gratidão, meu irmão, por manter viva a história de nossa cidade. Sem memória não há passado, nem futuro!
ResponderExcluirQue riqueza de texto . Uma história que até viajamos no tempo . Parabéns...
ResponderExcluirParabéns Zezinho!
ResponderExcluirHistória e cultura.
Sensacional, Zezinho!
ResponderExcluir(Fred Moreira)
“Um povo sem tradição é arvore sem raizes”, por isso ame a sua cidade e faça valer a riqueza de nossa cultura sabarense, para no futuro, afirmarmos com convicção:
ResponderExcluir“Eu fiz parte dessa história”!