"Bravo, Maestro!", de Lucas Duarte Neves

Membro-fundador da Academia de Ciências e Letras de Sabará
Cadeira 4. Patrono: Antônio Pinto Júnior


"BRAVO, MAESTRO!"


Você já se perguntou, vendo um concerto de uma Orquestra, Banda de Música, Coral, ou outro tipo de grupo musical, por que existe uma pessoa à frente dos músicos "Balançando os braços" de um lado para o outro? Aqueles movimentos que o Maestro realiza à frente dos grupos não são, ou pelo menos não deveriam ser, aleatórios. E hoje gostaria de trazer algumas curiosidades sobre o aspecto da técnica gestual da Regência Musical e sua importância para a performance de grandes grupos musicais.

Acredito que a função dos regentes, apesar de terem seu status reconhecido, é a menos conhecida do grande público. É provável que alguns vejam os movimentos apenas como malabarismos sem muito sentido, ou uma coreografia. Mas cada gestual do regente que se posiciona à frente de um grupo musical tem um significado expressivo e influencia diretamente na sonoridade dele.

A técnica gestual da Regência se consolidou de verdade a partir do século XVIII, tendo seus padrões de marcação de tempos e compassos definidos, via de regra, nessa época.

Em linhas gerais, a principal função do gestual do regente é fazer com que todos os músicos toquem juntos, em todos os sentidos! Em um primeiro sentido, o regente cuida do andamento da música, ou seja, da velocidade da obra, com movimentos de seu braço direito, que se articulam no antebraço, punho, mãos e, quando está presente, batuta.

Abrindo um parêntese, a batuta não é um item obrigatório para a Regência. A sua função é criar uma extensão para o braço do regente, como um recurso visual, para facilitar o entendimento de seu gesto quando está à frente de um grupo com muitos músicos. Porém, muitos regentes preferem não usar a batuta, sugerindo que dessa maneira conseguem ter mais recursos expressivos. Enfim, o uso da batuta dependerá muito do gosto e da busca expressiva de cada regente e da quantidade de músicos que o grupo contém.

Voltando ao gestual, como vimos, a mão direita cuida do andamento musical, unificando o pensamento dos músicos em relação a esse parâmetro. Além disso, a mão direita pode indicar o tipo de articulação das notas, como staccatto (notas bem curtas ou com pequenas pausas entre si) ou legato (notas interligadas, em fluxo contínuo, em estilo cantabile, ou seja, como se fossem cantadas). O movimento staccatto é mais rápido, tem menos amplitude e é um pouco brusco, com pequenos sobressaltos na movimentação. Em contrapartida, o gestual cantabile tem movimentos mais contínuos e mais amplos, desenhando de forma mais gradual os padrões de marcação do tempo da música. Há outros tipos de movimentos expressivos possíveis, mas esses dois dão uma dimensão importante nos contrastes do gestual da regência, existindo também uma gradação de movimentos entre um caráter e outro. 

Já o braço esquerdo pode ter funções variadas. Algumas vezes ele apenas reforça a marcação dos tempos da música, em outros momentos indica ao músico o momento certo de “atacar” uma nota depois de algum tempo maior em pausa, assim como sugere as intensidades da música — piano (suave), mezzopiano, mezzoforte, forte, fortíssimo, etc —, entre outros fatores expressivos, possuindo, dessa forma, uma gama de gestos mais variada que a mão direita. Podemos dizer até que a mão esquerda tem mais liberdade de movimentos do que a direita.

O Maestro Brasileiro Isaac Karabtchevsky costuma falar que “a mão direita é a ‘razão’ da música, e a mão esquerda é a ‘emoção’”. E realmente funciona dessa maneira. De forma geral, a mão e braço esquerdos ficam a par de todo o conteúdo expressivo das obras, enquanto a mão direita se detém na unificação do pensamento rítmico dos músicos. Apesar disso, ambos os braços podem complementar a ideia expressiva um do outro. O gestual não precisa ser totalmente preso nesses parâmetros, porém é preciso ter bastante consciência de cada movimento para que o gestual não se torne confuso ou ineficiente. Dessa forma, o trabalho das duas mãos é complementar uma à outra, sendo necessário que o regente domine com clareza a técnica gestual de ambas, tendo dessa forma recursos expressivos mais variados e mais adequados para cada situação musical, o que exige bastante tempo de estudo e dedicação.

Para além do gestual da regência que é visto por todos no palco durante os concertos e apresentações, existe o trabalho mais importante do regente, um trabalho “invisível”, que é essencial para que a performance musical e seu gestual funcione de maneira efetiva: O estudo das obras!

O regente deve conhecer profundamente cada detalhe das peças que rege, entendendo a fundo as questões teóricas e técnicas. É também necessário entender e compreender o contexto de época de cada obra e dos compositores. Isso requer um arcabouço de conhecimentos artísticos que são adquiridos com muito tempo de estudo e pesquisa. Uma peça que foi composta no século XVII não será tocada da mesma forma que uma do século XX, da mesma maneira que será diferente a execução de um arranjo de música popular. Tudo isso deve estar na cabeça do regente, de modo que ele consiga, através dos ensaios e do seu gestual, transmitir tudo isso aos músicos que ele está dirigindo.

E, por falar em ensaio, isso também é algo muito importante na prática da Regência. É necessário saber ensaiar. É no momento do ensaio que o regente combina com os músicos todos os detalhes da execução, corrige os possíveis erros e faz com que a música ocorra naturalmente. Por isso é tão importante ter tempo para ensaiar com os músicos, para que todas essas informações sejam maturadas e as questões expressivas sejam interiorizadas por eles. Esse tempo de ensaios deve estar na mente do regente de modo que ele consiga gerir e programar a quantidade de ensaios e de obras necessárias para fazer um determinado concerto.

Existem ainda várias outras questões referentes ao trabalho do regente, seja como técnico e diretor musical, seja como gestor de pessoas, animador e inspiração musical. Sim! Os regentes devem instigar e inspirar as pessoas na Música e com a Música. Trabalhando com jovens e adolescentes, eles devem ser pessoas idôneas, referenciais, não só na música, mas como humanos também, pois eles direcionam a formação cultural daqueles que ensinam, deixando neles a semente da criatividade e da potencialidade musical, do protagonismo de seus aprendizados e do querer fazer sempre o melhor possível.

A Música sempre terá potencial para agir além da própria Música, e, como líderes, os regentes devem estar cientes desses aspectos, para que seu gestual possua a potência musical e motivacional que todos buscam na prática de Música.




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Comentários

  1. Muito interessante!! Palmas para o maestro!!

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  2. Viva, querido maestro! Com batuta ou sem batuta , você dá o brilho especial à Orquestra,ao Coral e à nossa Banda!
    E seu texto foi muito esclarecedor para todos nós! Parabéns 👏🎊👏
    Mônica Granja

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