"Jogo de chá", de Selma Cândido Rossi

Membro-fundador da Academia de Ciências e Letras de Sabará
Cadeira 19. Patrono: Lucas José de Alvarenga

JOGO DE CHÁ

Jogo de chá, dela, deles.

Presente de casamento.

Lindo, encantava meus olhinhos infantis.

E ela, irmãzona, me servia o chá ou leitinho — eu era tão menina!

Depois guardava bem guardadinho em sua cristaleira linda.

— Presente chique de casamento — dizia orgulhosa!

Porcelana pintada à mão.

Florezinhas rosas e lilases, folhinhas verde-claras.

No entorno das bordas, um risco fininho dourado, toque do artista.

E lá ficava na cristaleira, muito bem guardado anos a fio...

E meus olhinhos brilhavam ao contemplá-lo!

Cresci. E ele lá, o jogo de chá completinho, lindo com antes.

Um dia, conversa vai e vem surge o assunto: casamento.

— Você vai se casar?

— Não, nunca — disse eu.

— Não quer ganhar um jogo de chá igual ao meu?

— Quero, mas sem casar, rsrs.

E veio o trato.

Disse-me ela:

— Vamos fazer um trato?

— Hummmmm.

— Quando você se casar, meu presente será o meu jogo de chá, esse que você ama.

— Não faça isso comigo! Que tal num aniversário ou Natal, sei lá?

— Não, o trato está feito, só quando você se casar.

Tempo passa, medo de casar também.

Casei-me.

E veio ela com meu presente — o jogo de chá.

Intactas pinturas.

Bule, xícaras, pires e açucareiro. Sem um machucadinho sequer!

Emocionada usei, mas poucas vezes, assim como ela, medo de danificá-lo.

Sobreviveu tanto!

Hoje, tirei do armário enfim!

E tirei tantas emoções do armário!

As florezinhas me sorriem, as folhinhas dão um tom de verde-claro ao meu dia cinza.

Vou tomar um chá.

Misturar ervas sentimentais, um tantão de cada sentimento: amor, gratidão, saudade e muito, muito cuidado com nossa história e nossa convivência. Minha amada irmã, seu presente está presente. Gratidão!

Guardar é bom.

Preservar é bom.

Usar é ainda melhor.

Deixemos acontecer!

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