"Clausura da alma", de José Eustáquio Evangelista

Membro-fundador da Academia de Ciências e Letras de Sabará
Cadeira 28. Patrono: Carlos Drummond de Andrade

 CLAUSURA DA ALMA

Minha mente devassa inspirações

que se espalham em alvores

dentro de mim.

Poemas se apresentam 

nas páginas dos desejos meus,

devassados pelo mal.

Quero saciar-me deles. 

Comendo-os. Lambendo-os.

Estão prontos.

Quero servi-los a alguém, a você,

como remédio dos males,

como alimento da inspiração,

como fruta doce da árvore

que é livro e que transforma

vidas.

Penso...

Nestes tempos de medo

a leitura me alimenta.

A cidade está deserta.

Muda.

As casas seculares guardam, 

dentro de si, 

assustados seres.

Sabará chora...

O mundo chora.

Já é noite. Lua cheia.

Seus raios de luar,

embaçados com nuvens de coronas,

caem medrosamente sobre

minhas inconstâncias

e mergulham

no mar de meu silêncio fúnebre.

A tristeza borda a sala, com angústias,

enquanto as pálpebras inquietas 

querem adormecer o olho

que chora.

A taça amarga do medo se oferece.

A clausura tenta me proteger

do medo.

Ele não pode entrar,

vagueia como assombração,

farejando portas

e janelas.

Encantos, já não há quem

os tem.

Máscaras aprisionam a alegria

e os desencantos,

num diálogo de pavor com o medo

alojado na alma.

Tem nome de descrença e mata, e...

escolhe velhos

e escolhe jovens.

Ataca e penetra pelos túneis

da existência, desmoronando

o arcabouço biológico da vida,

numa ação voraz e estúpida.

Minúsculo e de bunda grande

deixa nos alvéolos a merda

da extinção, excremento de morte

que sufoca.

É proibido respirar.

Tenho medo.

A humanidade está acuada.

É o espírito do mal

que tem nome

e precisa ir embora.

Vai embora,

ó pandemia da desgraça!

Suma!

~

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