CONTRIBUIÇÕES IMORTAIS: "As várias faces de uma máscara", Ana Paula Cruz

AS VÁRIAS FACES DE UMA MÁSCARA

ANA PAULA CRUZ

Membro-fundador da Academia de Ciências e Letras de Sabará
Cadeira 20. Patrono: Lúcia Machado de Almeida


Bem cedo ao sair de casa, já atrasada para trabalhar, abro o portão e avisto a vizinha, que me cumprimenta educadamente. Olha para o meu rosto como se quisesse me dizer algo, e logo entendo que esqueci de colocar a máscara de proteção, item essencial e obrigatório nos dias de hoje.

Retorno apressada, entro em meu quarto, abro a gaveta da cômoda e me deparo com dezenas delas: coloridas, estampadas, de estilos e modelos diferentes. Escolho a máscara da empresa onde trabalho e retorno minha caminhada. Encontro com muitas pessoas pelo caminho, a maioria delas devidamente “mascaradas”, e passo a observar a variedade e criatividade.

Tento imaginar as características de quem está por trás de cada uma delas e até o perfil e o estilo da pessoa de acordo com a escolha do acessório.

De dentro do ônibus, o motorista acena para mim, mas não consigo identificá-lo. Ele está com uma máscara do “Coringa”.

Um morador em situação de rua usa uma máscara cirúrgica tão desgastada que certamente não faria diferença se estivesse sem ela.

E, assim, sigo meu caminho, observo cada pessoa que passa por mim e a maioria delas reconheço rapidamente. Tenho o hábito de olhar nos olhos e assim identifico as pessoas conhecidas. Percebo que uma das grandes vantagens do uso da máscara é a necessidade de se olhar nos olhos. Como esta atitude é tão delicada e difícil para determinadas pessoas... Reconhecer através dos olhos!

Quando chego ao trabalho, “os mascarados”, meus colegas, estão com o mesmo “uniforme facial” que o meu.

Hoje, a máscara tornou-se sinônimo de proteção, cuidado, respeito... a si e ao próximo.

Atrás de cada uma delas consegue-se, algumas vezes, disfarçar sentimentos e emoções.

Acredito que muitas pessoas estão se sentindo tão bem ao usá-las, que até já sentem um certo aperto no coração ao imaginar um desuso futuro.

Chego à conclusão de que a máscara sempre fez parte do nosso cotidiano. Nos antigos festivais, carnavais, teatros, as pessoas se mascaravam para não serem reconhecidas e assim extravasarem todo o seu talento, alegria e até mesmo a falta de pudor sem serem reconhecidas.

Mas... na maioria das vezes, a máscara não é um adereço: é uma proteção, algo concreto. Vejo pessoas que usam máscaras emocionais (invisíveis a olho nu) para disfarçarem angústias, tristezas, medos, maldades, para distorcerem a personalidade, serem dominantes, dominados e aceitos nos diversos grupos sociais.

Muitos utilizam tanto este artifício que já não se reconhecem ao se olharem no espelho; são reféns; precisam usar suas máscaras emocionais por segurança, proteção à rejeição, ao preconceito, ao abandono ou simplesmente por não se aceitarem como são, e assim comunicam emoções e expressam sentimentos vazios.

Feliz aquele que está pronto para arrancar a máscara e olhar-se no espelho.

Citando, Victor Hugo:

“Arrancar a máscara, que livramento!”



Querido leitor, assine seus comentários!

Comentários

Postar um comentário