Apresentação GRUPO DE LEITURA MACHADO DE ASSIS: "MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS"

 


Material de apresentação do
GRUPO DE LEITURA MACHADO DE ASSIS

da ACADEMIA DE CIÊNCIAS E LETRAS DE SABARÁ


LEITURA COLETIVA

Memórias Póstumas de Brás Cubas

 

Mediação: Bernardo Lopes                                        

Realização: Academia de Ciências e Letras de Sabará

Apoio: Borrachalioteca e TGuerra Produções

 

Seja bem-vindo à leitura coletiva do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis!

Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839 e faleceu em 29 de setembro de 1908, no Rio de Janeiro. Seu quinto romance, Memórias Póstumas de Brás Cubas, foi publicado em formato de livro em 1881, sete anos antes da abolição da escravatura no Brasil.

Cronograma:

Exceto pelo dia 04/09, quando serão feitas as apresentações e orientações a nosso grupo, os capítulos, pré-determinados por data, deverão ser lidos antes dos encontros referentes a eles; as reuniões serão focadas no debate e análise dos capítulos.

DATA

PROGRAMAÇÃO

04/09

Apresentações e orientações para a leitura de Memórias Póstumas de Brás Cubas; leituras prévias.

11/09

Debate sobre capítulos I – Óbito do autor a XII – Um episódio de 1814.

18/09

Debate sobre capítulos XIII – Um salto a XXIX – A visita.

25/09

Debate sobre capítulos XXX – A flor da moita a LV – O velho diálogo de Adão e Eva.

02/10

Debate sobre capítulos LVI – O momento oportuno a LXXIX – Compromisso.

09/10

Debate sobre capítulos LXXX – De secretário a CI – A revolução dálmata.

16/10

Debate sobre capítulos CII – De repouso a CXXVI – Desconsolação.

23/10

Debate sobre capítulos CXXVII – Formalidade a CLX – Das negativas & encerramento.

 

Horário: 19h (duração de aproximadamente 2h)

Local: Borrachalioteca – R. Marieta Machado, 164, Centro, Sabará, MG.


Edições e links on-line: 

Quaisquer edições físicas do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas serão aceitas, mesmo as mais antigas, anteriores às novas regras ortográficas da Língua Portuguesa.


Memórias Póstumas de Brás Cubas já está em domínio público, como toda a obra de Machado, e pode ser encontrado facilmente na Internet para download ou para leitura on-line. Sites sugeridos:

 

·        https://machado.mec.gov.br

·        http://www.dominiopublico.gov.br

·        https://www.baixelivros.com.br

·        https://archive.org

 

Material complementar: 

A Academia de Ciências e Letras de Sabará disponibilizará, gratuitamente, por WhatsApp ou e-mail, uma pequena bibliografia complementar, que pode tornar a leitura do romance ainda mais clara e profunda.


Apesar de sua relevância, a leitura desse material complementar não é obrigatória, já que, durante os encontros, focaremos nos aspectos do livro Memórias Póstumas de Brás Cubas em si. A leitura do romance deve ser priorizada, sendo ele o tema central de nossos debates.

 

Para antes ou durante a leitura do romance: (clique para ler on-line e/ou baixar)


·        Contextualizando Machado de Assis” (PDF, 22 páginas);

·        Mapa do microcosmos machadiano (IMAGEM, 1 página);

 

Aproveite a leitura de Memórias Póstumas de Brás Cubas!

 

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— Bernardo Lopes, setembro, 2025.


INTRODUÇÃO:

BRÁS CUBAS: A AUTOBIOGRAFIA IMAGINADA — DO LADO CERTO DA FRONTEIRA

 

Publicado originalmente como folhetim entre março e dezembro de 1880 na Revista Brasileira, Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, foi lançado em livro no ano seguinte, sete anos antes da abolição da escravatura no Brasil. É considerado por muitos sua obra-prima (boa parte do público e da crítica se divide entre ele e Dom Casmurro). Na história, o fantasma de um aristocrata decadente decide escrever suas memórias. Ele as dedica ao primeiro verme que roeu seu cadáver e fala sobre seus romances fracassados, ambições políticas mornas e sua infância privilegiada atormentando os escravizados de sua casa. Compartilha conosco filosofias irrefletidas e, das profundezas de sua sepultura, reclama com entusiasmo das coisas da vida (e da própria escrita).

Nesta narrativa extremamente imaginativa, perversamente espirituosa e à frente de seu tempo, esta espécie de anti-herói faz rir ao mesmo tempo em que nos inquieta de reflexão e indignação.

Memórias Póstumas é o primeiro romance da chamada “segunda fase” de Machado. Toda a obra do escritor carioca, nascido em 1839 e morto em 1908, é vista, em teoria, como “divisível” em dois “momentos” diferentes: a primeira fase, mais romântica, e a segunda, mais realista. Alguns críticos e leitores não concordam totalmente com esse conceito, preferindo ver a obra machadiana como um continuum, que muda de caráter apenas gradualmente, sem claros pontos de divisão. Por exemplo, já é possível ver aspectos não-românticos em seus romances “românticos”. Mas até o próprio Machado chegava a falar dessas duas “categorias” em algumas das Advertências que abrem seus livros.

Seu primeiro romance é Ressurreição, de 1872, lançado quando o autor tinha 33 anos. É um livro breve e bastante direto — “o esboço de uma situação”, como Machado nos adverte na abertura —, com poucos personagens e o foco no contraste entre os caráteres e padrões emocionais e comportamentais dos dois protagonistas. (Curiosidade: já dá pra notar ali uma sementinha de Dom Casmurro, livro que só viria 27 anos depois e um trabalho tão maduro que foram necessários anos para que a crítica e o público leitor entendessem o que Machado estava fazendo com a gente. Somente na década de 1960, a crítica literária Helen Caldwell, em seu livro O Otelo brasileiro de Machado de Assis, levantou a hipótese de que Capitu — já morta quando o livro começa — poderia ser vítima das acusações de Bentinho, sugerindo que a visão patriarcal silenciou Capitu e a transformou em culpada injustamente e sem o direito de se defender. O livro, assim, não conteria uma resposta para o enigma de se Capitu traiu ou não traiu. A força da narrativa de Dom Casmurro está também nas lacunas.)

Em 1874, 1876 e 1878 vieram, respectivamente, A Mão e a Luva, Helena e Iaiá Garcia. Depois deste último, as coisas mudaram um bocado bom.

Muito pouco se sabe da vida íntima de Machado, mas o que se especula é que, por questões de saúde, o chamado Bruxo do Cosme Velho tenha sofrido uma mudança de perspectiva. Seu próximo livro pareceu romper um lacre em volta de sua arte: o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de 1881, apresenta características inéditas na literatura de Machado, do Brasil e, sim, do mundo. Harold Bloom, crítico norte-americano, diz que nosso escritor parece uma espécie de reincarnação de Laurence Sterne (1713–1768), romancista britânico conhecido principalmente por sua obra inovadora A vida e as opiniões do cavalheiro Tristram Shandy, que revolucionou a narrativa ao introduzir experimentalismo, digressões e elementos de metalinguagem no gênero romance. A abordagem irreverente e ousada de Sterne ajudou a expandir os limites da forma narrativa, deixando um legado duradouro na literatura mundial. Segundo Bloom, Machado foi “o maior discípulo de Laurence Sterne no Novo Mundo”; porém, “Machado, como o ironista genial que é, jamais ataca a sociedade diretamente”. A tradutora de Brás Cubas para o inglês Flora Thomson-DeVeaux concorda que não há ninguém equivalente a Machado de Assis na literatura. Ele é sem igual.

Depois de Memórias Póstumas, veio Casa Velha, romance curtinho por muito tempo esquecido, publicado em folhetim na Revista Estação entre 1885 e 1886, mas só ajuntado em forma de livro no século XX, em 1944, pela crítica e biógrafa Lúcia Miguel Pereira. Devemos nosso conhecimento dessa obra deliciosa, pouco lida, à sua paciência e perseverança na busca dos números perdidos da revista. Assim como o primeiro romance Ressurreição, a novela Casa Velha parece, em partes, um ensaio para Dom Casmurro (e Iaiá Garcia, um ensaio para Casa Velha).

Depois veio Quincas Borba, em 1891. Quincas Borba é um personagem secundário de Memórias Póstumas de Brás Cubas, mas ele não é o protagonista do livro, e sim Rubião. Dom Casmurro, pronto em 1899, foi publicado em 1900. Já Esaú e Jacó foi lançado em 1904. E Memorial de Aires, último romance de Machado, veio à luz em 1908, narrado por um personagem do livro anterior, Esaú e Jacó.

Neste mesmo ano, 1908, Machado faleceu.

 


 

A RESSURREIÇÃO DO BRUXO

Fábio Altman

 

“ALGUM TEMPO hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no introito, mas no cabo; diferença radical entre este livro e o Pentateuco.” As primeiras quinze linhas, com 101 palavras, de Memórias Póstumas de Brás Cubas, o clássico de Machado de Assis, são um convite irrecusável ao baile da leitura — figurariam, sem favor algum, entre os mais aderentes parágrafos inaugurais jamais escritos. Pode-se dizer, com a certeza de duas novas e elogiadíssimas traduções para o inglês do pícaro romance (The Posthumous Memoirs of Brás Cubas, de Flora Thomson-DeVeaux, para a editora Penguin; e de Margaret Jull Costa e Robin Patterson para as edições Liveright), que a obra do Bruxo do Cosme Velho foi redescoberta no idioma de William Shakespeare (1564-1616) e Laurence Sterne (1713-1768). É um defunto autor, e não um autor defunto — como se, 112 anos depois de sua morte, 140 anos depois da publicação original do folhetim [145 agora], entre março e dezembro de 1880, Machado anotasse, com algum pessimismo e muita ironia, como Brás, seu personagem, as aventuras do renascimento inesperado e tardio da obra-prima.

Convém ressaltar que já houve uma leva anterior de Machado em inglês, nos anos 1950 — naquele tempo, depois da II Guerra, os americanos, mesmo os mais cosmopolitas, enxergavam pouco mais do que o próprio umbigo. “Não tinham afeição por culturas estrangeiras, à exceção da francesa, tida como culta e sofisticada”, diz Earl Fitz, mestre em literatura comparada da Universidade de Nova York, professor do Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade Vanderbilt, do Tennessee, especialista em Machado. “A nova geração de leitores quer reduzir o paroquialismo tradicional, tem outros interesses.” Não se trata, por óbvio, de dizer que o escritor fluminense tenha virado best-seller, não — embora apenas a edição da Penguin já tenha sido impressa cinco vezes e sumiu na Amazon. Memórias Póstumas não é de fácil travessia, cujo estilo lembra “o andar dos ébrios”, segundo o falecido narrador. Mas o que há, afinal, em seus 160 curtos capítulos, aqui e agora, que não havia décadas atrás, e que atraiu hoje uma casta intelectualizada nos Estados Unidos? O americano Fitz, de português fluente, pega as páginas e abre o tomo no célebre capítulo CXVII, “O humanitismo”. Nele aparece, pela primeira vez, a antecipar um volume para chamar de seu, o filósofo Quincas Borba, e seu ideário: tal qual na Teoria da Seleção Natural de Charles Darwin, o Humanitismo revela que a sobrevivência se baseia na capacidade dos mais aptos de vencer. Para o crítico de literatura Antônio Candido (1918-2017), a essência da convicção machadiana, pendurada no Humanitismo, é “a transformação do homem em objeto do homem, uma das maldições ligadas à falta de liberdade ver dadeira, econômica e espiritual”. Corte-se para 2020. O capítulo escolhido por Earl Fitz, “um dos mais poderosos e penetrantes de toda a narrativa moderna”, faz de Memórias Póstumas um libelo contra as injustiças do sistema, do globalismo — isso tudo que já levou tanta gente às ruas e que a pandemia do novo coronavírus parece expor com desmedida crueldade.

Há, ainda, o interesse pelo olhar cotidiano de um tempo, no Brasil do fim do século XIX, em que a escravidão moribunda determinava as relações sociais, e, naturalmente, permeia o livro. Calhou de o lançamento nos Estados Unidos coincidir com o assassinato do homem negro George Floyd, asfixiado pelo joelho de um policial branco. Houve quem ligasse os pontos, pontos que devem mesmo ser ligados, de óculos limpos, e relacionou a vida no Rio de Janeiro daquele tempo com a intolerância do século XXI, e Memórias Póstumas virou contemporâneo — somado à evidência de Machado ser “o maior escritor negro da história da literatura universal”, como apontou o crítico Harold Bloom (1930-2019). Houve, por fim (ou seria como princípio?), o empurrão de um escritor jovem, Dave Eggers, que escreveu o prefácio da edição traduzida por Flora Thomson-DeVeaux e assinou uma resenha positiva na revista The New Yorker — para ele, o livro é um dos “mais espirituosos, divertidos e, portanto, mais vivos e atemporais de todos os tempos”. Não demorou, portanto, para que os elogios levassem ao boca a boca, e do boca a boca se redescobrisse um romance que trata de problemas universais, como a desigualdade e o racismo. A picardia, a inovação e a aparente leveza de Memórias Póstumas escondem algo muito maior. “Por trás de um monte de futilidades aparecem questões primordiais”, diz Flora. Ou, como ela mesmo postou no Twitter, o folhetim do nosso tempo: “Memórias Póstumas de Brás Cubas é, sem dúvida, um romance de sua época — mas também diz respeito a nossa época, de formas que pesam a favor de Machado de Assis e formas que pesam contra nós. Existem ecos — é só trocar a febre amarela pela Covid-19 — e existem continuidades — o racismo sistêmico, tão doloroso hoje quanto era nos anos 1880”. Machado de Assis reverbera. Deixa um legado, deixa rebentos, ao contrário de Brás Cubas, como registrado na pena de suas derradeiras linhas: “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”.

 

ALTMAN, Fábio. A Ressurreição do Bruxo. Veja, São Paulo, ano53, n.35 (ed.2701), p.8687, 26 ago.2020.

 


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